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terça-feira, 28 de setembro de 2010

Mais jornalismo, menos panfletagem

Por Alberto Dines, do Observatório da Imprensa

Este confronto entre o presidente Lula e a imprensa é artificial, não somos a Venezuela nem a Argentina. Este confronto é na realidade um confrontóide, parafraseando a semelhança fato-factóide.
Na sexta-feira (24/9) em Porto Alegre, ao lado da sua candidata, o presidente pregou o exercício da humildade para lidar com o noticiário que desagrada. Foi taxativo:

"Quando a matéria dos jornais sai falando mal da gente, ninguém gosta. Quando fala bem, o ego cresce. Precisamos de humildade para nem ficar com muito ego quando se fala bem nem ficar com muita raiva quando se fala mal."

A mudança de tom foi devidamente registrada pela Folha de S.Paulo e pelo Estadão, no sábado com razoável destaque. Mas no dia seguinte, domingo (16), a Folha publicou um raro editorial na primeira página com uma violenta contestação ao presidente pelos ataques contra a imprensa.

Ora, se no dia anterior Lula levanta a bandeira da humildade e sugere uma pacificação, por que insistir no clima de guerra? Aqueles que tomaram a decisão de soltar o petardo não leram a notícia por eles publicada sobre a mudança no ânimo do adversário?

Fora do expediente

Uma imprensa incapaz de perceber as sutilezas da política está evidentemente tão radicalizada e delirante quanto aqueles que denuncia. Na verdade, este pseudo-embate, confrontóide, está sendo agravado porque a mídia abriu mão de seus atributos e resolveu juntar-se ao presidente num palanque no qual nenhum dos dois deveria freqüentar.

O presidente Lula comete um erro quando se compara à imprensa – como o fez indiretamente na entrevista ao portal Terra, divulgada na quinta-feira (23/9). Se jornais e revistas não podem exercer o papel de fiscalizadores e críticos do governo – como alega – ele, presidente, não deveria funcionar como cabo eleitoral ostensivo, em tempo integral.

O próprio Lula havia prometido há poucas semanas que só faria campanha depois do expediente e nos fins de semana, quando não tem compromissos oficiais. A Presidência da República é cargo full-time, a promessa é capciosa, e além disso, não está sendo cumprida.

Exaltação generalizada

O eleitor que reside além dos limites do estado de S. Paulo não tem condições de ouvir no seu horário eleitoral um autêntico jingle radiofônico protagonizado pelo presidente e seus dois candidatos ao Senado. Não interessa se este tipo de atuação do chefe da nação é legal ou não, o que interessa é que este engajamento escancarado fere os protocolos, ritos e símbolos de uma democracia.

Tão enfezada como os seus detratores, a imprensa não sabe identificar tais transgressões e advertir a Justiça Eleitoral. Prefere aderir à exaltação generalizada. Esquece o seu poder irradiador.

Com um pouco mais de jornalismo e menos panfletagem, o presidente seria obrigado a ser mais presidente.

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